Para Marco Stefanini, liderar nunca foi sobre centralizar poder, mas sobre saber onde não estar. Fundador e CEO do Grupo Stefanini, ele construiu uma multinacional brasileira de tecnologia apostando em um princípio que costuma contrariar o instinto de muitos executivos: abrir mão do controle operacional para ganhar capacidade de adaptação e escala.
Essa visão foi detalhada no último episódio da primeira temporada do Humanamente Possível, programa do NeoFeed apresentado por Leonel Andrade.
Stefanini contou que sua empresa, que deve faturar R$ 8,4 bilhões neste ano e tem previsão de crescimento de 15% em 2026, começou apenas com ele e a esposa como funcionários. Boa parte do crescimento veio das cerca de 40 aquisições, mas com uma estratégia singular.
Ciente de que fusões e aquisições estão entre as operações mais complexas do mundo corporativo, especialmente em tecnologia, na qual o principal ativo são pessoas e conhecimento, o empresário resolveu construir um modelo organizacional descentralizado, estruturado em células que funcionam como pequenos negócios dentro do grupo.
Desde as primeiras aquisições, a empresa compra participações majoritárias em negócios nos quais enxerga potencial, mas mantém os fundadores à frente das operações, responsáveis pela gestão e pelos resultados.
Cada unidade controla receitas, custos e margens, reforçando responsabilidade direta e velocidade de decisão. “Autonomia não é ausência de cobrança. É clareza de responsabilidade”, diz Stefanini.
Outra lição de sua trajetória é a disciplina. Hoje, a Stefanini tem presença física em 46 países e atende clientes em mais de 100 mercados, mas o grupo cresceu sem investidores externos e sem endividamento. “Nunca tivemos investidor”, afirma. “Sempre fui muito conservador do ponto de vista financeiro.”
Para Stefanini, essa escolha moldou diretamente o tipo de liderança possível dentro da empresa. Sem capital abundante, cada decisão precisava ser sustentada no tempo, o que reduziu apostas impulsivas e aumentou o foco em eficiência, governança e geração de caixa.
Em momentos de crise — desde o Plano Collor no Brasil até os sucessivos choques econômicos na Argentina — essa disciplina funcionou como um mecanismo de sobrevivência. No novo ciclo tecnológico, marcado pela inteligência artificial, essa lógica ganha ainda mais relevância.
Na visão do empresário, o principal desafio das empresas deixou de ser acesso à tecnologia e passou a ser a forma como são lideradas. “Criar tecnologia hoje não é o problema. O problema é o mindset das pessoas”, afirma.
Em um ambiente em que a IA acelera decisões, reduz barreiras técnicas e encurta ciclos de mercado, lideranças excessivamente centralizadoras tendem a se tornar gargalos. Para Stefanini, a vantagem competitiva está em construir organizações capazes de aprender rápido, delegar com responsabilidade e ajustar rotas sem depender de ordens do topo.


