Um programa de vacinação contra herpes-zóster no País de Gales criou, sem querer, condições ideais para testar uma hipótese ousada: a vacina poderia proteger contra demência. Os resultados surpreenderam até os pesquisadores. Pessoas que receberam a imunização apresentaram 20% menos probabilidade de desenvolver demência ao longo de sete anos, comparadas àquelas que não tomaram a vacina, segundo estudo liderado pela Universidade Stanford e publicado na revista Nature. A descoberta ganha relevância diante do cenário global de envelhecimento populacional. Atualmente, mais de 55 milhões de pessoas vivem com demência no mundo, com cerca de 10 milhões de novos casos diagnosticados anualmente, conforme reportado pelo site ScienceDaily. Apesar de décadas de pesquisa focada no acúmulo de proteínas anormais no cérebro, ainda não existem tratamentos capazes de prevenir ou interromper a doença. O experimento natural que mudou o jogo A política galesa de vacinação, iniciada em setembro de 2013, estabeleceu um critério rígido: apenas pessoas com menos de 80 anos naquela data específica poderiam receber a vacina durante o ano seguinte. Quem completasse 80 anos antes de 1º de setembro ficava permanentemente inelegível. Esse detalhe burocrático transformou-se em oportunidade científica rara. A equipe analisou registros de saúde de mais de 280 mil adultos entre 71 e 88 anos sem demência no início do programa, focando em pessoas cujos aniversários as colocavam em lados opostos da linha de corte. "O que torna o estudo tão poderoso é que ele é essencialmente como um ensaio randomizado, com um grupo controle — aqueles um pouco velhos demais para serem elegíveis para a vacina — e um grupo de intervenção — aqueles jovens o suficiente para serem elegíveis", explicou Pascal Geldsetzer, professor assistente de medicina em Stanford e autor sênior do estudo. Proteção consistente sob diferentes ângulos Como esperado, a vacina reduziu casos de herpes-zóster em aproximadamente 37% entre vacinados. Mas o efeito sobre demência chamou mais atenção. Até 2020, quando os participantes tinham cerca de 86 e 87 anos, um em cada oito havia desenvolvido demência. Entre os vacinados, porém, a probabilidade de diagnóstico caiu 20%. "Foi uma descoberta realmente impressionante", disse Geldsetzer ao ScienceDaily. "Esse enorme sinal protetor estava lá, não importava de que maneira você olhasse os dados." Os pesquisadores testaram múltiplas explicações alternativas como escolaridade, acesso a outras vacinas, presença de doenças comuns como diabetes e problemas cardíacos. Nenhuma dessas variáveis explicou a diferença. A única distinção clara foi o menor número de diagnósticos de demência entre quem teve acesso à vacina. Benefícios para além da prevenção Um segundo estudo da mesma equipe, publicado em dezembro na revista Cell, investigou se os benefícios se estendiam a pessoas com declínio cognitivo já instalado. A resposta foi sim. Indivíduos vacinados apresentaram menor probabilidade de receber diagnóstico de comprometimento cognitivo leve durante nove anos de acompanhamento. O resultado mais marcante veio de pacientes que já tinham demência quando o programa começou. Quase metade dos 7.049 idosos galeses com demência no início do estudo morreram da doença durante o seguimento. Entre os vacinados, apenas cerca de 30% tiveram demência listada nos atestados de óbito, sugerindo uma progressão mais lenta da condição. "A parte mais empolgante é que isso realmente sugere que a vacina contra herpes-zóster não tem apenas benefícios preventivos e de atraso para demência, mas também potencial terapêutico para aqueles que já têm demência", destacou Geldsetzer. Outro padrão intrigante emergiu da análise por sexo: o efeito protetor apareceu substancialmente mais forte em mulheres do que em homens, possivelmente por diferenças nas respostas imunológicas. Dados globais e próximos passos Nos últimos dois anos, a equipe de Geldsetzer verificou registros de saúde de outros países com implementações similares: Inglaterra, Austrália, Nova Zelândia e Canadá. Os resultados ecoaram os achados galeses. "Continuamos vendo esse forte sinal protetor para demência em conjunto de dados após conjunto de dados", relatou o pesquisador ao ScienceDaily. O próximo passo almejado é um grande ensaio clínico randomizado, padrão-ouro de evidência científica. Geldsetzer busca apoio filantrópico para financiar o trabalho, parcialmente porque a vacina de vírus vivo atenuado já está fora de patente. Por ora, cientistas ainda não sabem exatamente como a vacina oferece proteção. Também permanece em aberto se uma vacina mais recente contra herpes-zóster, que usa apenas certas proteínas do vírus e é mais eficaz contra a doença, teria efeito similar ou superior sobre risco de demência. Herpes-zóster é doença viral desencadeada pelo mesmo vírus que causa catapora. Quando alguém contrai catapora, geralmente na infância, o vírus permanece inativo em células nervosas pela vida toda, podendo reativar em adultos mais velhos. A pesquisa reforça hipótese crescente de que certos vírus que afetam o sistema nervoso podem aumentar chances de desenvolver demência. Se os achados se confirmarem, sugerem que uma forma prática de prevenir demência pode já existir. Mais Lidas Um programa de vacinação contra herpes-zóster no País de Gales criou, sem querer, condições ideais para testar uma hipótese ousada: a vacina poderia proteger contra demência. Os resultados surpreenderam até os pesquisadores. Pessoas que receberam a imunização apresentaram 20% menos probabilidade de desenvolver demência ao longo de sete anos, comparadas àquelas que não tomaram a vacina, segundo estudo liderado pela Universidade Stanford e publicado na revista Nature. A descoberta ganha relevância diante do cenário global de envelhecimento populacional. Atualmente, mais de 55 milhões de pessoas vivem com demência no mundo, com cerca de 10 milhões de novos casos diagnosticados anualmente, conforme reportado pelo site ScienceDaily. Apesar de décadas de pesquisa focada no acúmulo de proteínas anormais no cérebro, ainda não existem tratamentos capazes de prevenir ou interromper a doença. O experimento natural que mudou o jogo A política galesa de vacinação, iniciada em setembro de 2013, estabeleceu um critério rígido: apenas pessoas com menos de 80 anos naquela data específica poderiam receber a vacina durante o ano seguinte. Quem completasse 80 anos antes de 1º de setembro ficava permanentemente inelegível. Esse detalhe burocrático transformou-se em oportunidade científica rara. A equipe analisou registros de saúde de mais de 280 mil adultos entre 71 e 88 anos sem demência no início do programa, focando em pessoas cujos aniversários as colocavam em lados opostos da linha de corte. "O que torna o estudo tão poderoso é que ele é essencialmente como um ensaio randomizado, com um grupo controle — aqueles um pouco velhos demais para serem elegíveis para a vacina — e um grupo de intervenção — aqueles jovens o suficiente para serem elegíveis", explicou Pascal Geldsetzer, professor assistente de medicina em Stanford e autor sênior do estudo. Proteção consistente sob diferentes ângulos Como esperado, a vacina reduziu casos de herpes-zóster em aproximadamente 37% entre vacinados. Mas o efeito sobre demência chamou mais atenção. Até 2020, quando os participantes tinham cerca de 86 e 87 anos, um em cada oito havia desenvolvido demência. Entre os vacinados, porém, a probabilidade de diagnóstico caiu 20%. "Foi uma descoberta realmente impressionante", disse Geldsetzer ao ScienceDaily. "Esse enorme sinal protetor estava lá, não importava de que maneira você olhasse os dados." Os pesquisadores testaram múltiplas explicações alternativas como escolaridade, acesso a outras vacinas, presença de doenças comuns como diabetes e problemas cardíacos. Nenhuma dessas variáveis explicou a diferença. A única distinção clara foi o menor número de diagnósticos de demência entre quem teve acesso à vacina. Benefícios para além da prevenção Um segundo estudo da mesma equipe, publicado em dezembro na revista Cell, investigou se os benefícios se estendiam a pessoas com declínio cognitivo já instalado. A resposta foi sim. Indivíduos vacinados apresentaram menor probabilidade de receber diagnóstico de comprometimento cognitivo leve durante nove anos de acompanhamento. O resultado mais marcante veio de pacientes que já tinham demência quando o programa começou. Quase metade dos 7.049 idosos galeses com demência no início do estudo morreram da doença durante o seguimento. Entre os vacinados, apenas cerca de 30% tiveram demência listada nos atestados de óbito, sugerindo uma progressão mais lenta da condição. "A parte mais empolgante é que isso realmente sugere que a vacina contra herpes-zóster não tem apenas benefícios preventivos e de atraso para demência, mas também potencial terapêutico para aqueles que já têm demência", destacou Geldsetzer. Outro padrão intrigante emergiu da análise por sexo: o efeito protetor apareceu substancialmente mais forte em mulheres do que em homens, possivelmente por diferenças nas respostas imunológicas. Dados globais e próximos passos Nos últimos dois anos, a equipe de Geldsetzer verificou registros de saúde de outros países com implementações similares: Inglaterra, Austrália, Nova Zelândia e Canadá. Os resultados ecoaram os achados galeses. "Continuamos vendo esse forte sinal protetor para demência em conjunto de dados após conjunto de dados", relatou o pesquisador ao ScienceDaily. O próximo passo almejado é um grande ensaio clínico randomizado, padrão-ouro de evidência científica. Geldsetzer busca apoio filantrópico para financiar o trabalho, parcialmente porque a vacina de vírus vivo atenuado já está fora de patente. Por ora, cientistas ainda não sabem exatamente como a vacina oferece proteção. Também permanece em aberto se uma vacina mais recente contra herpes-zóster, que usa apenas certas proteínas do vírus e é mais eficaz contra a doença, teria efeito similar ou superior sobre risco de demência. Herpes-zóster é doença viral desencadeada pelo mesmo vírus que causa catapora. Quando alguém contrai catapora, geralmente na infância, o vírus permanece inativo em células nervosas pela vida toda, podendo reativar em adultos mais velhos. A pesquisa reforça hipótese crescente de que certos vírus que afetam o sistema nervoso podem aumentar chances de desenvolver demência. Se os achados se confirmarem, sugerem que uma forma prática de prevenir demência pode já existir. Mais Lidas

Vacina de herpes-zóster reduz risco de demência em 20%, mostra estudo

2025/12/04 21:19

Vacina contra herpes-zóster mostrou redução de 20% no risco de demência em estudo com idosos no País de Gales

Isenção de responsabilidade: Os artigos republicados neste site são provenientes de plataformas públicas e são fornecidos apenas para fins informativos. Eles não refletem necessariamente a opinião da MEXC. Todos os direitos permanecem com os autores originais. Se você acredita que algum conteúdo infringe direitos de terceiros, entre em contato pelo e-mail service@support.mexc.com para solicitar a remoção. A MEXC não oferece garantias quanto à precisão, integridade ou atualidade das informações e não se responsabiliza por quaisquer ações tomadas com base no conteúdo fornecido. O conteúdo não constitui aconselhamento financeiro, jurídico ou profissional, nem deve ser considerado uma recomendação ou endosso por parte da MEXC.